Todo mundo nessa vida quer ser feliz, de preferência o tempo todo, o que não é pecado. Acontece que ser feliz nunca foi tarefa fácil, e porque atualmente vem deixando de ser uma conquista para se tornar obrigação, está perto de se transformar em missão impossível, ou quase.
É consenso que felicidade é uma sensação de bem estar e contentamento, ligada à satisfação pessoal. E é exatamente aí que começam os problemas. Como tem muita gente que não está satisfeita com o que é, mas quer ser mais feliz do que é, mente. Tem aqueles que mentem para parecer mais ricos do que são. Os que mentem para parecer mais bem relacionados. Tem também os chatos de plantão, que mentem para parecer mais cultos do que são. Sem falar daqueles que transformam suas vidas em uma perfeição e mentem tanto, que mais parecem semideuses a viver no Olimpo.
Também não serve qualquer coisa para ser feliz. Não. No ideal de felicidade da vida moderna não há espaço para a simplicidade e singeleza, tudo precisa ser trepidante, estonteante, excitante, esfuziante. Ter saúde? Não basta. É preciso ser magérrimo, lindo, sarado, sempre jovem. Dinheiro? Precisa ter muito para você fazer viagens exóticas, estar sempre na moda, ter coisas de marca e acumular tudo aquilo que não precisa, só para dizer que tem. Amor, só se for todinho maiúsculo, cheio de surpresas e emoções sempre, com muita paixão e sexo selvagem e diário.
E assim vamos vivemos, felizes e insatisfeitos, na sociedade do ter e do parecer.
Tristeza, medo, ansiedade, dor, sofrimento? Nem pensar. Tudo que não é felicidade é doença e deve ser imediatamente eliminado, de preferência por meio de medicamentos, ao que a indústria farmacêutica agradece. Normal é ser feliz.
Para nos mantermos afastados das desgraças, transformamos a violência, a fome e a miséria em números, meras estatísticas propaladas pela mídia, que não nos dizem respeito. E acomodados à mediocridade, à inércia do conformismo e à falta de sentido do consumismo ostentatório, com um liminar cada vez mais baixo para suportar frustrações, de tão cheios de ego, mais parecemos uma pequena ilha de consciência flutuando no mar do inconsciente.
E assim vamos vivemos, felizes e alienados, na sociedade do óbvio, onde tudo flutua à superfície.
Completamente absortos na missão de ser feliz, nem nos damos conta de que esse ideal pronto e imposto é irreal e inatingível, e aos poucos está nos transformando em uma geração de humanos que teme sua própria humanidade, com cada vez menos tempo para sentir.
Só que triste mesmo é não sentir nada, e esquecermos que são nossos momentos de dor, tristeza, frustração, ansiedade, medo que nos dizem a importância sobre a vida, representam um aviso importante de que algo deve ser mudado e nos ajudam a seguir em frente, no longo e tortuoso caminho da vida.
Como bem resumiu nosso grande Guimarães Rosa, “felicidade se encontra nas horinhas de descuido”. Assim, se cabe um conselho, só posso dizer: - Relaxe, e seja HUMANAMENTE feliz.
E falando
em felicidade, não posso deixar de recomendar o blog da minha querida amiga
Inês Büschel, que realizou um extenso estudo e escreveu dois textos muitos bons a
respeito. Vale a pena conferir.
Também
recomendo a leitura dos textos de Eliane Brum “O Doping dos Pobres” - “ Promover saúde não é sufocar a
dor da vida com drogas legais”. http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI90539-15230,00-O+DOPING+DOS+POBRES.html
E “O Doping das Crianças” – O que o aumento
do consumo da “droga da obediência”, usada para o tratamento do chamado
Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, revela sobre a medicalização
da educação?
http://revistaepoca.globo.com/Sociedade/eliane-brum/noticia/2013/02/o-doping-das-criancas.html
Ambos os textos tratam da transformação,
cada vez mais frequente na sociedade moderna, de questões socais e humanas em
biológicas, e de forma lúcida suscitam a reflexão.
Será que bem debaixo dos nossos olhos está ocorrendo o doping legalizado das nossas crianças, cada vez mais cedo diagnosticadas como doentes? Será
que a escola, em vez de olhar cada aluno a partir da sua história e sua
singularidade, está sendo agente de um processo de homogeneização e
silenciamento de crianças e adolescentes considerados “diferentes”? Estaria a
droga da obediência sendo usada como uma espécie de “método pedagógico”
perverso? Por que não há uma discussão mais ampla em toda a sociedade
brasileira?

Afinal, quem
é normal e o que é normalidade?
Não podemos ser ingênuos a ponto de esquecer
a força e os interesses da indústria farmacêutica, muito menos fechar os olhos
para o peso que o rótulo e a classificação como doente ou portador de um
transtorno trazem para qualquer indivíduo, inclusive pelo preconceito social
existente. Precisamos estar atentos.
Aliás, esse é um assunto que tem preocupado muitos
Promotores de Justiça, principalmente os que atuam na área da infância e juventude,
em razão da assustadora quantidade de ações que vêm sendo ajuizadas em busca do
fornecimento dos medicamentos, com base em diagnósticos singelos e cada vez
mais precoces, a indicar que essa questão vem adquirindo sim, de forma rápida e
silenciosamente, dimensões preocupantes e assustadoras.
Também vale a pena ler o texto “Permissão para ser INfeliz”, também da Eliane Brum.
http://revistaepoca.globo.com/Sociedade/eliane-brum/noticia/2013/01/permissao-para-ser-infeliz.html
E, finalmente, não poderia deixar de lembrar o
livro infantil chamado Pollyana, que nos ensina sobre “o jogo do contente”, um estratagema
simples, útil e muito valioso, da escritora estadunidense
Eleonor H. Poter, publicado no ano de 1913, que li quando menina.
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