quarta-feira, 17 de agosto de 2016

VOCÊ TEM MEDO DE QUÊ?

                                    escrito por ANNATROTTAYARD

                                       Quando somos criança, costumamos pensar que ser corajoso é não ter medo. Grande bobagem!!!
                                 O medo é inerente ao homem e também aos animais irracionais. Assim, todo mundo nessa vida tem medo, inclusive os corajosos. E por diversas razões. É uma pena que não nos expliquem isso antes.
                                   Segundo a Wikipédia “o medo é uma sensação que proporciona um estado de alerta demonstrado pelo receio de fazer alguma coisa, geralmente por se sentir ameaçado, tanto física como psicologicamente.
                                   É também uma reação obtida a partir do contato com algum estímulo físico ou mental (interpretação, imaginação, crença) que gera uma resposta de alerta no organismo. Esta reação inicial dispara uma resposta fisiológica no organismo que libera hormônios do estresse (adrenalina, cortisol) preparando o indivíduo para lutar ou fugir.
                                   O medo começa na ansiedade e termina no pavor. E pode se transformar em doença, quando vira uma fobia.”
                                   Conheço muita gente que teme fantasmas, almas do outro mundo, saci pererê, assombração, satanás, alma penada e tantos outros fenômenos sobrenaturais. Confesso, já tive medo disso também, um dia.
                                   Hoje, porém, tenho medo mesmo é de gente viva. Tenho medo da falta de humanidade. Das instabilidades das gentes. Da falta de diálogo, do extremismo e da intolerância. Tenho medo de quem promove o medo como forma de correção ou coação. E dos políticos que votam por Deus e exclusivamente por suas famílias, sem se preocupar com o interesse público e o bem-estar de todos.
                                   Também tenho medo que a saudade sufoque, que a rotina acomode, que o medo me impeça de tentar. Tenho medo de errar.
                                   Até a natureza, tão venerada por ecologistas e ambientalistas me dá medo. Principalmente quando me lembro do Katrina, do tsunami na Indonésia, dos terremotos do Chile e do Japão. Que medo!!!
                                    Também tenho medo do futuro, onde a água não exista mais. Do futuro em que a gente desembale mais do que descasque coisas para comer. E do futuro para jovens meninas, por não ver o futuro prosperar em defesa delas na velocidade necessária.
                                   Tenho medo das incertezas do caminho. Da minha bondade se esvair na ingratidão e no egoísmo alheio. De não saber mais discernir o certo do errado neste mundo de valores cada vez mais confusos.
                                   Tenho muito medo da insegurança das ruas, do desconhecido, do imprevisto, do imprevisível e da morte, então... nem se fale!!!
                                   E tenho mais um montão de medos, que demoraria dias para relacionar aqui. Ou seja, medo é o que não me falta.
                                   Mas, sinceramente?! Mesmo com tantos medos, não me sinto uma covarde. Acho que porque, hoje, sei que toda coragem precisa do medo para existir e talvez também tenha aprendido, de alguma forma, que o medo tem validade objetiva. Se com medo tornarmo-nos covardes, sem medo tornarmo-nos temerários. Por isso, podemos sim usar os nossos medos de forma benéfica e a nosso favor. E se fizermos isso, ele não será um defeito, muito menos algo negativo.
                                   Quando alguém sente medo é porque há, ou pode haver, alguma ameaça. Assim, sentir medo é não só aceitável, mas algo razoável e desejável. Em certa medida, o medo pode até proteger. O problema está apenas quando ele ultrapassa a medida do aceitável e se transforma em medo exagerado, que nos paralisa. Esse sim não é nada bom, porque paralisados, anulamos completamente nossa capacidade de viver e conviver. E a vida é puro movimento.
                                   Pesquisando sobre o medo, percebi que durante a história, poucas vezes os filósofos se ocuparam dele. Thomas Hobbes, filósofo do século XVII, e que tornou famosa a frase “o homem é o lobo do homem”, foi um dos poucos a pensar o medo como um sentimento manipulável que estaria na base da fundação do estado social.
                                   Hobbes viveu em tempos conturbados para a coroa de seu país, e suas ideias tinham muito a ver com a clima de incertezas que marcou aquela época, onde o movimento liberal, que defendia a redução do poder da realeza, vinha ganhando cada vez mais força.
                                   Contrariando outros filósofos políticos e o anseio revolucionário da época, ele acreditava que o homem não possui uma disposição natural para a vida em sociedade, na verdade, possui sim, uma natureza regida pelo egoísmo e pela autopreservação.
                                   Esse instinto abriria caminho para a violência contra o próximo, ao mesmo tempo em que nos obrigaria a buscar uma “paz” comum que nos desse segurança, representada pelo contrato social. Ou seja, a autoridade política teria a função específica de proteger os homens uns dos outros. Sem medo não haveria governabilidade, mas o governo deveria justamente tornar a vida das pessoas livre do medo.
                                   Essa teoria de Hobbes explicaria a função do governo e, por outro lado, a obediência dos homens às leis que viriam regular as relações humanas, sempre perturbadas pelo medo que os homens têm dos próprios homens.  
                                  Mas também pude constatar que, na verdade, somos convocados a sentir medo o tempo todo.
                                  Bancos e empresas de seguro, por exemplo, usam esse argumento abertamente. Políticos espalham temores para arrebanhar votos, jornalistas faturam em cima de catástrofes, biólogos citam vírus letais quando querem obter fundos para desenvolver vacinas, e por aí vai.
                                   Até a moda e o grande e glorioso marketing se utilizam dele, só que usam mensagens mais sutis. Como nos explica o publicitário dinamarquês Martin Lindstrom, ela “joga com o medo de não pertencermos ao grupo”. "O desodorante traz outro medo, de que você não vai conseguir namorada com seu cheiro. A mesma lógica vale para xampus, branqueadores de dente e academias de ginástica. Afinal, malhamos para estar saudáveis, ou por medo de ficar flácidos?", questiona Lindstrom.
                                   Na verdade, boa parte da propaganda explora o medo da rejeição social. E esse medo nunca foi tão forte.
                                     E é interessante, que todo mundo propaga o medo. Não necessariamente por maldade ou interesse próprio. "Se eu disser que há uma doença mortal se espalhando na sala onde você está, você sairá dela mesmo sem saber se é verdade. E vai avisar as outras pessoas", diz Lindstrom.         
                                   Com tudo isso, não é de se estranhar que o medo tenha se tornado o maior problema psicológico do nosso tempo, virando parte do dia a dia de todo mundo.
                                   Segundo dados do Instituto Nacional de Saúde Mental dos EUA, 20,8% das pessoas têm transtorno de ansiedade, ou seja, passam o tempo inteiro com medo de alguma coisa (pois a ansiedade nada mais é do que medo antecipado, de algo que pode ou não ocorrer).        
                                    Mas, será que ter medo é tão ruim? Afinal, se olharmos sob outro ângulo, é ele que, de uma maneira ou de outra, nos move todos os dias para alguma direção.
                                    A questão é que, em uma sociedade que perde o sentido dos sentimentos diariamente, o medo se torna mais um destes nomes para uma diversidade de sensações inespecíficas, e não há uniforme especial, máscaras ou abrigos plásticos que possam nos proteger dele. Só nós mesmos podemos nos proteger dos nossos próprios medos.                            
                                   O medo, assim como a dor, tem um objetivo. É um chamado para mudar de atitude, comportamento ou pensamento, para acordarmos e nos conhecermos melhor. Ele pode nos ajudar a entender mais sobre nossas deficiências e nos forçar a encarar a realidade, o que, na verdade, é um grande presente. E admiti-lo, certamente, é o primeiro passo.
                                   Como nos resume Aaron T. Beck, psiquiatra norte-americano e professor emérito do departamento de psiquiatria na Universidade da Pensilvânia, conhecido como pai da Terapia Cognitiva, no livro The Anxiety and Worry Workbook ("O Manual da Ansiedade e da Preocupação", inédito no Brasil), "A forma como pensamos influencia a maneira como sentimos. Portanto, mudar o modo como pensamos pode mudar como nos sentimos", pode parecer banal, mas funciona e tem efeitos neurologicamente comprovados.
                                   Por exemplo: se você vai a uma entrevista de emprego e fica pensando que podem te fazer perguntas que você não sabe responder, ficará ansioso e com medo. Entretanto, se pensar que está muito bem preparado, isso certamente lhe trará tranquilidade e segurança. 
                                   Para Izabel Telles, terapeuta holística e sensitiva formada pelo American Institute for Mental Imagery de Nova Iorque, “não dá para interromper os estímulos e os acontecimentos que o mundo gera, mas podemos aprender a controlar a nossa fábrica de imagens, revertendo os hologramas aterradores, assustadores e monstruosos que a mente pode vir a criar. A neurologista Katherina Hauner, por sua vez, acredita que a exposição gradual da pessoa ao objeto ameaçador ajuda a superá-lo.
                                    O admirável Franklin D. Roosevelt, no seu discurso de posse, em 1933, declarou acreditar firmemente que ""a única coisa que temos a temer é o próprio medo".
                                   E de fato: nunca sentimos tanto medo e nunca tivemos tanto medo dele, e talvez seja mesmo essa a chave do problema e também sua grande solução. Perder o medo do medo.
                                   Há pouco tempo, soube que uma grande e querida amiga está com metastase e terá que enfrentar um tratamento bastante difícil para lutar pela vida, e  fiquei com muito medo. Por ela e por mim. Ser confrontada com a incerteza do futuro é assustador!!!
                                   Então, passeando pelos jardins da minha memória, me lembrei da minha mãe, que na minha opinião, foi a pessoa mais corajosa que conheci, e também do dia em que disse isso a ela, e ela me respondeu: - Não sou corajosa, filha. Apenas estava num barco que naufragou, e tive que sair nadando. Foi nesse dia em que aprendi o verdadeiro significado de coragem.
                                   Por tudo isso, esse post é uma singela homenagem à minha mãe e à todos os grandes nadadores da vida que conheci, que naufragaram e continuaram nadando, nadando e nadando...até o fim.
                                   À minha amiga, desejo com todas as minhas forças e meu coração, que ela continue sendo esse Michael Pelphes que ela é, e que ainda ganhe muitas e muitas outras medalhas, na sua vida afora. Até o fim.

 

 





 

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