Eu choro. Choro no
cinema, vendo reportagens sobre crianças que passam fome. Choro ao saber de
injustiças, lendo as passagens emocionantes de um livro. Choro se me contarem
uma história triste. E se a história for muito bonita, eu também choro. E já senti muita raiva por ser assim. Também
já tive vergonha. Senti-me infantil e bobona. Pensei até em fazer terapia.
Então, num belo dia, li uma história africana, “Cachoeiras douradas”, onde um
mago protege uma menina escrava fugida, encontrada chorando tanto que suas lágrimas criam
uma cachoeira, atrás da qual a menina se refugia. Em outra história, também
africana, “O chocalhar dos ossos”, as lamas de curandeiros são invocadas ao se
aspergir a terra com lágrimas de crianças.
A partir de então, comecei a me interessar pelas lágrimas. Descobri que nas mitologias, o surgimento de lágrimas provoca uma criação imensa e uma união sincera. No folclore das ervas, as lágrimas são usadas como um aglutinante, para prender elementos, unir ideias, reunir almas. Nos contos de fadas, quando as lágrimas brotam, elas espantam ladrões ou provocam inundações nos rios. Quando são salpicadas, invocam os espíritos. Quando derramadas sobre um corpo, curam lacerações e restauram a visão. Quando tocadas, causam a concepção. Ainda nos contos de fadas, as lágrimas também transformam as pessoas, fazendo com que se lembrem do que é importante e salvando sua própria alma. Existem histórias em que a primavera chega com uma chuva de lágrimas. Em outras, a entrada para o mundo subterrâneo ocorre com uma cascata de lágrimas. Tem aquelas ainda, onde uma lágrima, percebida por uma pessoa bondosa, é compreendida como um pedido de aproximação.
Compreendi que, na realidade, as lágrimas detêm
poder criativo. Elas atraem as coisas para nós, consertam tudo, fornecem a peça
ou o pedaço que faltava. Nas lágrimas, há um poder de atração e dentro delas
existem imagens poderosas que nos orientam. Elas não só representam o
sentimento, mas são também lentes através das quais adquirimos uma visão
alternativa.
Continuo não gostando de chorar, porque sempre fico
de nariz vermelho, e, em público, ainda sinto um pouco de vergonha. Mas cá entre nós: -
Neste admirável mundo de contradições em que a gente vive, emocionar-se não é
uma felicidade? E hoje, sei que chorar me faz bem, porque se trata apenas da
minha humanidade, se manifestando.
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