terça-feira, 25 de novembro de 2014

UMA RECEITA, PARA VARIAR

      O apetite, assim como o sexo, sempre foram os grandes motores da história. Provocam guerras e canções, influenciam religiões, a lei e a arte e são os responsáveis pela preservação e propagação da espécie. Tanto é assim, que estão no rol dos sete pecados capitais, o que significa que, se não existissem, certamente o número de almas no Paraíso seria bem maior.
      Talvez seja por isso que calvinistas e outros aspirantes à perfeição cristã comam mal. Já os católicos, que nascem resignados ao pecado original e às fraquezas humanas e são purificados pelo sacramento da confissão, prontos para tornar a pecar, são muito mais flexíveis com relação à boa mesa. Felizmente, eu nasci e cresci dentre os últimos, o que me leva a crer, seja essa a origem do meu interesse pela culinária.
       Certa vez li num livro, que a culinária é o “resultado da luta entre um povo e sua terra”, e achei essa definição perfeita. Mesmo se procurarmos, não encontraremos na história nenhum povo sobre a Terra que não possua, de alguma forma, tradições ligadas à gastronomia.
       Entretanto, o que mais me fascina na culinária, é o fato dela ser uma arte capaz de aguçar quatro dos nossos cinco sentidos. Assim como o erotismo, a comida entra pelos olhos, se intensifica com o olfato, passa pelo tato, relacionado às texturas apuradas pela língua e boca, para finalmente chegar ao paladar. Deve ser por isso que muita gente se refere às comidas boas, como sendo aquelas para “comer de joelhos”, com certeza o único jeito para se redimir de tanto pecado.
       Mas é uma pena que, mesmo sendo tão essencial, aindasejam poucos os que efetivamente se interessem pela culinária. Principalmente no nosso continente, onde os machos em geral, continuam considerando toda e qualquer atividade doméstica um perigo para a sua virilidade. Mal sabem eles como nós mulheres, nos impressionamos com homens entendidos em comida.
       Claro que aqueles 'gourmets', capazes de escolher pratos em francês em um cardápio e discutir sobre vinhos com o 'sommelier' inspiram muito respeito, mas não é a eles que estou me referindo. Tão pouco me refiro àqueles caras desajeitados, ataviados, que se declaram especialistas e com grandes gestos chamuscam uma picanha na churrasqueira. 
      Refiro-me aos que sabem escolher os ingredientes e preparam-nos com arte, para oferecerem-nos como um presente para os sentidos e a alma. Esse homens com classe para abrir garrafas, cheirar o vinho e vertê-lo primeiro em nossa taça para que o provemos, enquanto descrevem os sucos, a cor, a suavidade, o aroma e a textura do 'filet mignon' naquele tom que, nos parece, utilizarão mais tarde para se referirem aos nossos próprios encantos.    
       Certamente você já viu, em algum filme, uma cena como essas. E, muito provavelmente, ela foi protagonizada por algum bonitão/bonitona de Hollywood, o que o impediu de perceber que todo aquele charme girava, na realidade, em torno da arte de cozinhar.
       Eu tive certeza a respeito do verdadeiro poder da culinária, quando uma amiga me contou sua história. Aconteceu quando ela foi convidada para um daqueles encontros marcados para conhecer o amigo solteiro da amiga da amiga, ao qual todos nós ficamos sujeitos após um período de celibato, sabe?
       O jantar estava marcado na casa dele, e ela, como não podia deixar de ser, foi a primeira a chegar. Nos seus delírios celibatários, havia fantasiado uma versão madura do Che Guevara, entretanto, quando a porta de abriu, deu de cara com, nada mais nada menos, que uma versão piorada do Van Gogh. Não que ela tivesse alguma coisa contra pintura impressionista, mas aquele desconhecido baixinho, de olhos apavorados e cabelos vermelhos foi uma desilusão. Como não tinha para onde fugir, resignou-se e entrou. Foi imediatamente conduzida para a cozinha, o que naquelas circunstâncias achou ótimo.       
       Ao chegar na cozinha, porém, aquele homenzinho se transformou. Algo mudou em sua atitude, como quem domina o território. Instalou-a confortavelmente em uma cadeira e começou a resgatar os ingredientes da geladeira. Pegou as panelas e frigideira com graça e destreza inesperadas e, enquanto lhe contava sobre suas aventuras pela América, fazia as facas dançarem partindo verduras e mariscos para dourá-los com mão leve em azeite de oliva. O aroma que surgia da frigideira, a música ao fundo e a conversa agradável fizeram-na tremer.
       Então, ele lançou o macarrão na água fervente e, num abrir e fechar de olhos, preparou um molho translúcido a base de limão. Quando Van Gogh finalmente colocou em cima da mesa a travessa com um fumegante macarrão a La pescatore, como o chamou, ela suspirou vencida. Estão casados até hoje. Como ela me confidenciou, muitas vezes o segredo está "no contraste e na surpresa."
        Tenho que confessar que quando contei essa história aqui em casa, todos riram muito. Ao final, meu filho mais novo, muito embora seja o mais 'gourmet' da casa, continuou impassível, com o olhar incrédulo, Deve ser porque ele ainda está naquela idade onde a beleza e o charme são coisas bem mais objetivas. Já o meu marido, interessou-se mesmo em saber quem era essa minha amiga, 'coitada'. Apenas o meu filho mais velho, com seu estilo 'Don Juan', que concluiu de modo bastante simplório que, em algum momento da sua vida, dedicará um tempo para aprender uma receita 'das boas', para alguma eventualidade.
       Considerando que santo de casa não faz milagres, acho que o saldo foi positivo.
       Por tudo isso, achei que estava na hora de postar no blog uma das minhas receitas, para variar, para todos aqueles que, um dia, quiserem transformar algo trivial em uma ocasião inesquecível.
        Trata-se de uma receita rápida e fácil, que não irá exigir de você muito tempo e energia na elaboração, para que possa desfrutar de todos os seus efeitos, tanto antes como durante e depois.
        Como já mencionei, a comida, assim como o erotismo, entra pelos olhos. Assim, não se esqueça de caprichar no visual - da comida, da mesa e no seu. Comece se arrumando em frente ao espelho e pare apenas quando estiver feliz com o resultado. Assegure-se, porém, de estar confortável - ninguém consegue acertar o sal ou o cozimento com uma calça ou sapatos apertados.
        Na mesa, coloque seus melhores pratos e copos, velas e um pequeno enfeite no centro, de preferência com flores ou folhagem. As velas, você pode colocar em copos virados ao contrário, como na foto abaixo. Ficam um charme. Optei por colocar dentro do copo e no centro da mesa hortelã, mas você pode usar salsinha ou manjericão. É barato, fácil de encontrar e o suficiente para dar um toque bem especial.


Com guardanapo de papel também fica ótimo.
         
E se não tiver vasinho, pode usar garrafas de cerveja ou vinho.
Ponha uma boa música ambiente, acenda apenas algumas luzes. Inspire-se e use e abuse da imaginação.
A preparação de qualquer prato pode se transformar em um ritual de aproximação e compartilhamento, com requintes de sedução.

SALMÃO COM ALHO PORÓ- BY ANNA
- O grande segredo, na hora de comprar o salmão, é pedir para tirarem todos os espinhos com pinça, assim como a pele e a parte escura da carne que fica embaixo dela. Feito isso, pegue uma travessa de vidro e forre com alho poró cortado em rodelas não muito grossas, ponha o salmão em cima dessa ‘cama’ e passe nele manteiga e sal. Então, coloque meio copo de água, cubra com papel alumínio e leve ao forno por aproximadamente 20 minutos, em forno 180o.
- À parte, misture uma lata de creme de leite com três colheres de sopa de molho pesto, que você pode fazer ou comprar pronto, no supermercado.
- Se optar por fazer, você vai precisar de manjericão, um dente de alho, queijo parmesão ralado, nozes e azeite. Então, bata tudo no liquidificador até ficar uma pasta homogênea e misture ao creme de leite. Mas se preferir,pode colocar apenas o creme de leite, que já fica excelente.
- Retire o papel alumínio, coloque sobre o salmão o molho e volte para o forno por apenas cinco minutos, para aquecer. Na hora se servir jogue por cima pistache ou amêndoas em lâminas, o que preferir.
- Fica uma delícia com purê de batatas ou mesmo arroz branco. E acompanhado por um bom vinho branco gelado, o sucesso será garantido.
     Muito embora tenha demorado para entender, porque sempre insistiam em me dizer que o que se dava entre eles era uma “profunda afinidade espiritual”, hoje vejo que o sucesso de muitos casais se dá em razão do sólido pilar construído no feroz equilíbrio entre o erotismo e a boa comida. Assim, deixo aqui a minha dica.
  E lembre-se: o melhor presente que podemos dar a alguém é o nosso tempo.
'BON APPÉTIT'

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