ESCRITO POR ANNATROTTAYARYD
Tem dia que eu acordo com a sensação de não ter dormido.
Abro os olhos e minha cabeça parece que vai estourar de tantos pensamentos. Mas
não é estouro de dor de cabeça. É explosão lá dentro, na alma. Pura
inquietação.
Nesses
dias, geralmente a vida e a realidade me doem. Então, com a cara mais inchada
do mundo eu me espreguiço, levando e começo. Do verbo transitivo dar começo a.
Do verbo intransitivo ter começo em. Do meu verbo, levanta e vai.
E eu levanto e vou.
Pensando que escrever é muito diferente de falar, e que possivelmente, o que a
gente mais goste de escrever seja justamente aquilo que menos conseguimos
anunciar.
Escrever e falar:
duas coisas indissociáveis, opostas, antagônicas e tão complementares. Tudo ao
mesmo tempo. No mesmo espaço e na mesma pessoa. E em qualquer pessoa, em qualquer
tempo e em qualquer espaço.
Então escrevo, tipo terapia. Talvez, por covardia. Com certeza, para tentar
me entender e quem sabe poder me contar, para mim mesma e para os outros. Decifrar
meus enigmas. Resgatar minhas lembranças, preencher os meus vazios.
Talvez, assim, eu
não me perca. Quem sabe, um dia, alguém me leia...
Esses são os dias mais difíceis. Escrevo e apago, não acabo, me apago e me guardo...quem sabe outro dia...
Nesses dias, quase
sempre eu choro, e o meu mundo fica todo borrado. Mas tudo bem, nem ligo. Já aprendi que
é no mundo borrado que a gente encontra os mais difíceis e lindos encantos e é
molhando os olhos que a gente clareia a alma. Por isso não me importo e sigo em
frente, tentando clarear as ideias e escrever tudo aquilo que penso e gostaria
de falar.
Mas,
tem dias em que a inquisição fala mais alto. A inquisição é
uma espécie de assembleia composta pela mente pensadora, a mente crítica e a
mente “do contra”, que se reúne dentro da minha cabeça, para longas sessões de
debates sobre como e por qual motivo eu insisto em escrever tanta baboseira.
Persistente, a inquisição exigi dias até que consiga reunir forças e argumentos
suficientes para vencer os debates internos e seguir em frente.
Aí
vem a hora da libertação! Quando finalmente crio coragem e desprendimento suficientes
para apertar aquela tecla que todo mundo tem, mas muitos desconhecem, porque
fica guardada no canto da alma, num compartimento ultrassecreto e que rege tudo
o que o Vaticano diz ser ruim.
Você
não sabe qual é?
Confesso
que demorei muito para encontrar a minha, e o dobro de tempo até conseguir
apertá-la. Sempre achei que se apertasse esse botão tudo daria errado, ou alguma
coisa explodiria, mas não. E acreditem, nada é mais profundo e rebuscado do
que apertar o “foda-se”.
Quando
isso acontece, é como se eu fosse salpicada por um pó mágico de desprendimento e
irreverência que me faz parar de odiar o que faço e me permite pensar com mais
clareza sobre o que eleger como importante na minha vida e o que considerar
insignificante, o que é muito libertador.
No
final, tudo isso vale a pena. Os dias de inquietação. O choro. A gestação demorada e doída. A digestão, que exige reflexão
e muita perseverança. A cruel inquisição, e finalmente, a libertadora irreverência,
sem a qual nada seria possível e publicado.
E, de repente, as coisas vão retomando seu lugar e posso dormir, de novo, o sono tranquilo dos sobreviventes.
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