segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

A DURA ARTE DA ESCREVINHAÇÃO


                                          ESCRITO POR ANNATROTTAYARYD       

                                               Tem dia que eu acordo com a sensação de não ter dormido. Abro os olhos e minha cabeça parece que vai estourar de tantos pensamentos. Mas não é estouro de dor de cabeça. É explosão lá dentro, na alma. Pura inquietação.                                    
                                                Nesses dias, geralmente a vida e a realidade me doem. Então, com a cara mais inchada do mundo eu me espreguiço, levando e começo. Do verbo transitivo dar começo a. Do verbo intransitivo ter começo em. Do meu verbo, levanta e vai. 
                                                E eu levanto e vou. Pensando que escrever é muito diferente de falar, e que possivelmente, o que a gente mais goste de escrever seja justamente aquilo que menos conseguimos anunciar.                                                    
                                               Escrever e falar: duas coisas indissociáveis, opostas, antagônicas e tão complementares. Tudo ao mesmo tempo. No mesmo espaço e na mesma pessoa. E em qualquer pessoa, em qualquer tempo e em qualquer espaço.
                                                Então escrevo, tipo terapia. Talvez, por covardia. Com certeza, para tentar me entender e quem sabe poder me contar, para mim mesma e para os outros. Decifrar meus enigmas. Resgatar minhas lembranças, preencher os meus vazios. 
                                                 Talvez, assim, eu não me perca. Quem sabe, um dia, alguém me leia...                        
                                                 Nesses dias, quase sempre eu choro, e o meu mundo fica todo borrado. Mas tudo bem, nem ligo. Já aprendi que é no mundo borrado que a gente encontra os mais difíceis e lindos encantos e é molhando os olhos que a gente clareia a alma. Por isso não me importo e sigo em frente, tentando clarear as ideias e escrever tudo aquilo que penso e gostaria de falar. 
                                                  Mas, tem dias em que a inquisição fala mais alto. A inquisição é uma espécie de assembleia composta pela mente pensadora, a mente crítica e a mente “do contra”, que se reúne dentro da minha cabeça, para longas sessões de debates sobre como e por qual motivo eu insisto em escrever tanta baboseira.  
                                                   Esses são os dias mais difíceis. Escrevo e apago, não acabo, me apago e me guardo...quem sabe outro dia...
                                                   Persistente, a inquisição exigi dias até que consiga reunir forças e argumentos suficientes para vencer os debates internos e seguir em frente.                 
                                                   Aí vem a hora da libertação! Quando finalmente crio coragem e desprendimento suficientes para apertar aquela tecla que todo mundo tem, mas muitos desconhecem, porque fica guardada no canto da alma, num compartimento ultrassecreto e que rege tudo o que o Vaticano diz ser ruim.
                                                    Você não sabe qual é?
 
 
                                                   Confesso que demorei muito para encontrar a minha, e o dobro de tempo até conseguir apertá-la. Sempre achei que se apertasse esse botão tudo daria errado, ou alguma coisa explodiria, mas não.  E acreditem, nada é mais profundo e rebuscado do que apertar o “foda-se”.
                                                   Quando isso acontece, é como se eu fosse salpicada por um pó mágico de desprendimento e irreverência que me faz parar de odiar o que faço e me permite pensar com mais clareza sobre o que eleger como importante na minha vida e o que considerar insignificante, o que é muito libertador. 
                                                    No final, tudo isso vale a pena. Os dias de inquietação. O choro. A gestação demorada e doída. A digestão, que exige reflexão e muita perseverança. A cruel inquisição, e finalmente, a libertadora irreverência, sem a qual nada seria possível e publicado.     
                                                    E, de repente, as coisas vão retomando seu lugar e posso dormir, de novo, o sono tranquilo dos sobreviventes.   
 

 
 

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